quarta-feira, maio 31, 2006

Tinha que ter...

Colo aqui o repente do Almirante Nelson, que eu ainda não conheço, mas que descobri através do blog Copy & Paste. Achei ótimo, a começar pelo nome do blog dele: Ao mirante, Nelson!

A PELEJA DE NHONHÔ DAN BROWN COM O CORONÉ LEONARDO

Eis que então chegou ao céu
Aquele autor tão vendido
Exclamando “What the hell?
Terei realmente morrido?”
Aí viu se aproximando
O cabra de barba branca
Que por São Pedro ele tomou
E foi logo afinando:
“Me fodi, comme il faut,
É hoje que o céu me desanca”

Começou a matutar
Uma argumentação
Do tipo “Me deixa entrar
O que eu fiz foi só ficção!”
Mas aí o excomungado
Culpado por seu acinte
Viu que o recepcionista
Não era o santo citado
O erro saltava à vista:
Era o coroné da Vinci!

E ali no portão celeste
Leonardo mandou ver:
“Mano Brown, o que fizeste?
Olha com quem tu foi mexer!”
E o morto, incontinenti
Disse, ainda cheio de si:
“Pela minha auto-estima
Me diga imediatamente
Já que estamos aqui em cima:
Do que foi que eu morri?”

Leonardo, enfarado
Disse então: “Não sabes não?
Desde que foste publicado
Vendeste que nem sabão
Com tanta grana na conta
E o sucesso comercial
Encheste o cu de dinheiro
E o diagnóstico aponta:
Fodeste o intestino inteiro
Por obstrução anal!”

Nhonhô Brown disse: “Well,
Fiquei sem eira nem beira:
Vim parar logo no céu
Onde querem minha caveira
Se eu soubesse que ia dar bosta
Não fazia o bestseller
Fui mexer com um vespeiro
Que católico nenhum gosta
Devia sacar ligeiro:
Fui mais cego que a Hellen Keller!”

Mas coroné Leonardo
Que gostava de um mal-feito
Disse: “Alivio teu fardo
Nisso eu até que eu dou um jeito
Tu mexeste com a Igreja
Que de doido tá assim
Da Opus Dei fizeste pouco:
Um hospício, ora veja,
Que além de reunir louco
Ainda é a base do Alckmin!”

E o ralho prosseguiu:
“Vilipendiaste minha obra
Em nome do metal vil
Ali de arte nada sobra:
Foste venal, amiúde,
Fazendo um tal nonsense
Uma história tão maluca
Que serviu pra Hollywood
Vender como um suspense
Com o Tom Hanks de peruca!

Mas gostei de tua leréia
Posso até te reencarnar
Pois me ocorre uma idéia
E acho que tu vais gostar
Pra isso, te dou abrigo
E até cedo o mote:
Que tal um livro novo
Sacaneando meu inimigo
Que me esculhambava ao povo:
Michelangelo Buonarroti?!?”

E assim Nhonhô Dan Brown
Voltou ao mundo dos viventes
Fez um livro que era o tal
História sem precedentes
Narrando que a escultura
De Davi, desde o começo
Nada tinha a ver com glória
Trazia outra leitura
Era outra a história:
“Golias, eu não te esqueço!”

Nelson Moraes

IX

Aqui vou eu, do alto do meu Livro-Caixa-De-Surpresas, que mais parece um maço antigo de cartas, nem todas de amor, mas todas queridas. Agradeço (sempre) a quem me apresentou Manoel de Barros.

O apanhador de desperdícios

Uso a palavra para compor meus silêncios.
Não gosto das palavras
fatigadas de informar.
Dou mais respeito
às que vivem de barriga no chão
tipo água pedra sapo.
Entendo bem o sotaque das águas.
Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimportantes.
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos mísseis.
Tenho em mim esse atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por isso.
Meu quintal é maior do que o mundo.
Sou um apanhador de desperdícios:
Amo os restos
como as boas moscas.
Queria que a minha voz tivesse um formato de canto.
Porque eu não sou da informática:
eu sou da invencionática.
Só uso a palavra para compor meus silêncios.

(Memórias Inventadas - A infância. Ed. Planeta, 2003, em uma encadernação linda em forma de presente.)

quarta-feira, maio 17, 2006

Metade - Oswaldo Montenegro

Que a força do medo que tenho
não me impeça de ver o que anseio
que a morte de tudo o que acredito
não me tape os ouvidos e a boca
pois metade de mim é o que eu grito
mas a outra metade é silêncio.

Que a música que ouço ao longe
seja linda ainda que tristeza
que a mulher que eu amo seja pra sempre amada
mesmo que distante
porque metade de mim é partida
e a outra metade é saudade.

Que as palavras que falo
não sejam ouvidas como prece nem repetidas com fervor
apenas respeitadas como a única coisa
que resta à um homem inundado de sentimento
porque metade de mim é o que ouço
mas a outra metade é o que calo.

Que essa minha vontade de ir embora
se transforme na calma e na paz que eu mereço
que essa tensão que me corrói por dentro
seja um dia recompensada
porque metade de mim é o que penso
e a outra metade um vulcão.

Que o medo da solidão se afaste
que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável
que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
que me lembro ter dado na infância
porque metade de mim é a lembrança do que fui
e a outra metade não sei.

Que não seja preciso mais que uma simples alegriapra me fazer aquietar o espírito
e que o teu silêncio me fale cada vez mais
porque metade de mim é abrigo
mas a outra metade é cansaço.

Que a arte nos aponte uma resposta
mesmo que ela não saiba
e que ninguém a tente complicar
pois é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
porque metade de mim é platéia
e a outra metade é a canção.

E que a minha loucura seja perdoada
porque metade de mim é amor
e a outra metade também.

terça-feira, maio 16, 2006

Banheiro feminino

Banheiro Feminino

- Filho da puta!
- Hã?
- *sopro raivoso* Eu queria dar pra ele e o idiota não notou!
- Quem?
- O Jorge...- *olhos arregalados* Amiga, tu e o Jorge tão se pegando?
- Estávamos, agora não mais. Filho da puta.
- Ah, mas é assim mesmo, semana que vem você tenta de novo.
- Não, mas hoje era o último dia em que eu poderia dar pra ele.
- ?
- Esqueceu que eu tenho um casamento pra ir dia 28?
- E...?
- Bem, se eu for pro casamento dia 28, tenho de depilar a perna dia 26. Pra poder depilar com cera, tenho que deixar crescer durante quinze dias...Então, a partir do dia 11, nada de gilete. Hoje é dia 10, domingo. Eu tinha que ter dado ontem, que era sábado e eu podia chegar de madrugada em casa.
- Você transa de acordo com a sua depilação?
- Pode me chamar de neurótica.
- E em quê isso torna o Jorge um Filho da puta?
- A gente saiu sexta. Eu queria dar pra ele, mas não sabia se ia rolar ou não. Então, fui de calça comprida e levei a gilete na bolsa; se pintasse o clima, era só procurar o banheiro mais próximo.
- E pintou?
- Aí é que tá. Pintou UM clima, mas não rolou porque tinha uns amigos nossos lá, e tal...Mas quando a gente se despediu, ele me beliscou, sabe?
- No braço ou na cintura?
- Na cintura...
- Então ele realmente tava a fim!
- LÓGICO! Aí, eu pensei: "Hoje não deu, mas amanhã eu dou!" E convidei o Jorge pra sair. Ele rindo, sabe como é o Jorge, "se é pra diversão, pode me chamar!".
- E no sábado?
- Eu devia ter adivinhado. Devia ter levado a gilete na bolsa e pronto. Mas aí eu pensei que as minhas chances de dar seriam elevadas se eu usasse saia...E aí, tive de tomar aquele banho, esfregar com esponja, passar esfoliante, tomar cuidado pra não me cortar...
- Mas você nao é alérgica a gilete?
- O que eu não faço pra dar pro Jorge? Cá pra nós, aquele homem é alguma divindade hindu reencarnada no Brasil pra fazer as mulheres felizes na cama. Pelamor, nunca vi nada tão grand...ioso.
- *ar sonhador* É...
- Como é que você sabe?
- Hã, eu? Sei de nada, bobagem sua. Me conta, como foi no sábado?
- *Desconfiada* Huuuum...como eu tava dizendo, botei um vestido preto que fica quatro dedos acima do joelho. Uma coisa eu descobri: se você mostra demais, o homem aprecia, baba, mas se você mostra só um pouco o homem delira. Certo, botei o vestido e fui, toda perfumada e de pulseira, pro lugar combinado.
- E o Jorge?
- Primeiro, começou com um papinho de mandar mensagem pro meu celular dizendo que não tinha certeza se ia poder ir; depois, confirmou que ia, mas ia chegar meio atrasado. Quando enfim ele chegou, quarenta e dois minutos depois de me ligar dizendo que já estava a caminho, foi o golpe de misericórdia.
- O que foi?
- Veio trazendo mais duas amigas....
- FILHO DA PUTA!
- Não disse? Além de ter desperdiçado meu último dia útil pra sexo do mês, estou com a perna pipocando de alergia...
- Filho da puta...

as aventuras da menina prodígio colado por Jan em 10.1.06
Essa e outras coisas ótimas em http://copy-paste.blogspot.com/

Ana Cristina César

Tenho uma folha branca
e limpa à minha espera:mudo convite
tenho uma cama branca
e limpa à minha espera:mudo convite
tenho uma vida branca
e limpa à minha espera:

Do livro Inéditos e Dispersos, Ana Cristina Cesar: Ed. Brasiliense

sexta-feira, maio 05, 2006

Frase da Quinta-feira

"Se você quiser esquecer todos os seus problemas, use sapato apertado."

quinta-feira, maio 04, 2006

Veríssimo e as palavras - a missão

Fui procurar aquele texto que recebi por email e postei aqui. Curiosamente, encontrei outro, com o mesmo início, mas outro final. Só que este último é muito mais pomposo, com referência bibliográfica e tudo. Então, retiro o outro e posto esse, apesar de gostar muito do Miúde e de sua maneira de ser. O site de onde tirei é http://ciberduvidas.sapo.pt tem outras coisas legais lá.

Pudor* - 3/10/1997

Luís Fernando Veríssimo**

Certas palavras nos dão a impressão de que voam, ao saírem da boca. "Sílfide", por exemplo. É dizer "Sílfide" e ficar vendo suas evoluções no ar, como as de uma borboleta. Não tem nada a ver com o que a palavra significa. "Sílfide", eu sei, é o feminino de "silfo", o espírito do ar, e quer mesmo dizer uma coisa diáfana, leve, borboleteante. Mas experimente dizer "silfo". Não voou, certo? Ao contrário da sua mulher, "silfo" não voa. Tem o alcance máximo de uma cuspida. "Silfo", zupt, plof. A própria palavra "borboleta" não voa, ou voa mal. Bate as asas, tenta se manter aérea mas choca-se contra a parede. Sempre achei que a palavra mais bonita da língua portuguesa é "sobrancelha". Esta não voa mas paira no ar, como a neblina das manhãs até ser desmanchada pelo sol. Já a terrível palavra "seborréia" escorre pelos cantos da boca e pinga no tapete.

"Trilhão" era uma palavra pouco usada, antigamente. Uma pessoa podia nascer e morrer sem jamais ouvir a palavra "trilhão", ou só ouvi-la em vagas especulações sobre as estrelas do Universo. O "trilhão" ficava um pouco antes do infinito. Dizia-se "trilhão" em vez de se dizer "incalculável" ou "sei lá". Certa vez (autobiografia) tive de responder a uma questão de Geografia no colégio. Naquele tempo, a pior coisa do mundo era ser chamado a responder qualquer coisa no colégio. De pé, na frente dos outros e - o pior de tudo - em voz alta. Depois descobri que existem coisas piores, como a miséria, a morte e a comida inglesa. Mas naquela época o pior era aquilo. "Senhor Veríssimo!" Era eu. Era irremediavelmente eu. "Responda, qual é a população da China?" Eu não sabia. Estava de pé, na frente dos outros, e tinha que dizer em voz alta o que não sabia. Qual era a população da China? Com alguma presença de espírito eu poderia dizer: "A senhora quer dizer neste exato momento?", dando a entender que, como o que mais acontece na China é nascer gente, uma resposta exata seria impossível. Mas meu espírito não estava ali. Meu espírito ainda estava em casa, dormindo. "Então, senhor Veríssimo qual é a população da China?" E eu respondi:

- Numerosa.

Ganhei zero, claro. Mas "trilhão", entende, era sinônimo de "numeroso". Não era um número, era uma generalização. Você dizia "trilhão" e a palavra subia como um balão desamarrado, não dava tempo nem para ver a sua cor. E hoje não passa dia em que não se ouve falar em trilhões. O "trilhão" vai, aos poucos, se tornando nosso íntimo. É o mais novo personagem da nossa aflição. Quantos zeros tem um trilhão? Doze, acertei? Se os zeros fossem pneus, o trilhão seria uma jamanta daquelas de carregar gerador para usina atômica parada. Felizmente vem aí uma reforma e outra moeda, com menos zeros e mais respeito. Se não chegaríamos à desmoralização completa.

- E o troco do meu tri?

- Serve uma bala?

Desconfio que o que apressará a reforma é a iminência do quatrilhão. "Quatrilhão" é pior que "seborréia". Depois de dizer "quatrilhão" você tem que pular para trás, senão ele esmaga os seus pés. E "quatrilhão" não é como, por exemplo, "otorrino", que cai no chão e corre para um canto. "Quatrilhão" cai, pesadamente, no chão e fica. Você tenta juntar a palavra do chão e ela quebra. Tenta remontá-la fica "trãoliqua" e sobra o agá. A mente humana, ou pelo menos a mente brasileira, não está preparada para o "quatrillião". As futuras gerações precisam ser protegidas do "quatrilhão". As reformas monetárias, quando vêm, são sempre para acomodar as máquinas calculadoras e o nosso senso do ridículo, já que caem os zeros mas nada, realmente, muda. A próxima reforma seria a primeira motivada, também, por um pudor lingüístico. No momento em que o "quatrilhão" se instalasse no nosso vocabulário cotidiano, mesmo que fosse só para descrever a dívida interna, alguma coisa se romperia na alma brasileira. Seria o caos.

E "caos", você sabe. É uma palavra chiclé-balão. Pode explodir na nossa cara.

*Crônica, uma das 266 publicadas no livro "Comédias da Vida Pública", L&PM Editores, São Paulo.

**Escritor e humorista brasileiro nascido em Porto Alegre, em 1936. Autor entre outros livros, de "Analista de Bagé" (na centésima edição), "O analista de BAgé & Outras do Analista", "Amor Brasileiro", "O Jardim do Diabo", "Peçoas Íntimas", "O Santinho" e "Sexo na Cabeça".

quarta-feira, maio 03, 2006

Conversa com quem sabe das coisas.....


É o próprio Amigo do Rei....rs